Trivela
·19 de agosto de 2020
Trivela
·19 de agosto de 2020
O RB Leipzig fez história na Champions League. Pela primeira vez, um clube sediado no antigo território da Alemanha Oriental alcançou as semifinais da principal competição de clubes da Europa. Obviamente, o modelo de negócio da Red Bull é bastante diferente do que se vivia nos tempos de comunismo no país dividido. Mas, indo além da discussão política, esta era uma barreira que nem os antigos esquadrões da DDR superaram entre 1958/59 e 1991/92 – os anos em que estiveram presentes na Champions.
Para resgatar esse passado, listamos as melhores campanhas da Alemanha Oriental nas copas europeias. Pegamos todos os times que chegaram às quartas de final da Champions, bem como os que foram ao menos semifinalistas na Recopa e na Copa da Uefa. A ideia é apresentar um pouco do pano de fundo sobre cada agremiação, bem como pontuar as caminhadas brevemente e destacar também os principais jogadores da época. Confira:
O futebol na antiga Alemanha Oriental começou a se organizar de maneira mais sistemática a partir da década de 1950. Seguindo o “modelo soviético”, os clubes se estruturavam calcados na indústria local e nas entidades estatais dentro do regime comunista. Entretanto, a conquista da Copa do Mundo pela Alemanha Ocidental em 1954 gerou pressão nos vizinhos, com um investimento maior para que a “resposta ideológica” viesse em campo. Nestes primórdios, uma força alemã-oriental era o Wismut Karl-Marx-Stadt.
Localizado na cidade de Aue e ligado à mineração de urânio, o Wismut quase foi transferido para Karl-Marx-Stadt (atual Chemnitz), numa tentativa das autoridades em atrelar uma equipe forte a uma metrópole local. A mudança encontrou resistência dos torcedores e, no fim das contas, o clube seguiu atuando em Aue, apesar de levar o nome de Karl-Marx-Stadt e de ser administrado na nova cidade. Independentemente desta divisão, a agremiação conquistou quatro títulos da Oberliga entre 1955 e 1959. Foi assim que se tornou a primeira representante da Alemanha Oriental na Copa dos Campeões, registrando boa campanha na estreia em 1958/59.
A primeira partida do Wismut Karl-Marx-Stadt seria encrespada. A equipe encarou o Petrolul Ploiesti e, depois da vitória por 4 a 2 na Alemanha Oriental, perdeu de 2 a 0 na visita à Romênia. Os resultados forçaram um jogo-desempate em Kiev, com a goleada por 4 a 0 colocando os germânicos nas oitavas de final. Depois, enfrentaram o IFK Göteborg, com o empate por 2 a 2 na Suécia abrindo caminho para a goleada por 4 a 0 em Aue. A campanha seria encerrada nas quartas, diante do Young Boys. As equipes empataram por 2 a 2 em Berna, com o Wismut à frente no placar até os 42 do segundo tempo. O marcador ficou zerado na Alemanha Oriental, com mais uma partida extra, agora em Amsterdã. O triunfo por 2 a 1 classificou os suíços.
Dentre os destaques daquela equipe do Wismut Karl-Marx-Stadt estava o meia Manfred Kaiser, que chegou a superar os 300 jogos pela Oberliga e também foi nome recorrente na seleção da Alemanha Oriental. Já veterano, seria o primeiro ganhador do prêmio de melhor do ano no futebol local, em 1963. Autor de quatro gols naquela campanha, Willy Tröger também se destacava. O atacante começou a carreira como goleiro, mas perdeu a mão após ser atingido por uma granada durante a Segunda Guerra Mundial. Na nova posição mais à frente, chegou a ser artilheiro da liga em 1955. O time também tinha à disposição os irmãos Klaus e Siegfried Wolf, símbolos do período vitorioso na década de 1950. Vale salientar ainda que o herdeiro do antigo Wismut é o atual Erzgebirge Aue.
O Carl Zeiss Jena surgiu em 1903, fundado por funcionários da indústria óptica Carl Zeiss. Entretanto, o clube passaria por diferentes rebatismos a partir da instituição do regime comunista na Alemanha Oriental. Após 1954, começou a ser conhecido como Motor Jena, até retomar o nome de Carl Zeiss em 1966. Neste ínterim, o clube conquistou a Copa da Alemanha Oriental e fez sucesso na Recopa Europeia, alcançando as semifinais em 1961/62. A surpresa seria batida apenas por um poderoso Atlético de Madrid.
Aquela campanha teria interferência direta da Guerra Fria. A Alemanha Oriental construía o Muro de Berlim e passou a sofrer uma série de sanções da OTAN, inclusive com vistos negados a seus cidadãos em países do bloco capitalista. Por isso, o Motor Jena não atuou nos estádios de seus adversários. A caminhada começou contra o Swansea, campeão da Copa de Gales. Depois do empate por 2 a 2 em campo neutro na Áustria, o Motor Jena ganhou por 5 a 2 em casa. Os alemães-orientais teriam menos piedade ainda do Alliance Dudelange, de Luxemburgo: golearam por 7 a 0 no Estádio Ernst Abbe, antes de se contentarem com o empate por 2 a 2 em Erfurt, na Alemanha Oriental. Já nas quartas, pegaram o Leixões, treinado por Filpo Núñez.
A princípio, existia um acordo para que o Motor Jena viajasse a Lisboa. O clube, entretanto, preferia fazer as duas partidas na Alemanha Oriental. O Leixões negou a possibilidade, mas logo depois a OTAN manteria o veto à viagem – em decisão que também teve influência da ditadura salazarista. Assim, depois do empate por 1 a 1 em Jena, os alemães-orientais avançaram com o triunfo por 3 a 1 em Gera – outra cidade da república. A situação só não seria suficiente para derrubar o Atlético de Madrid na semifinal. Joaquín Peiró determinou a vitória por 1 a 0 em Jena, antes da goleada por 4 a 0 em Malmö, com dois gols de Mendonça e outros dois de Miguel Jones. O Atleti de José Villalonga terminaria com a taça.
Treinador do Motor Jena de 1958 a 1971, Georg Buschner deixaria o clube apenas para assumir a seleção da Alemanha Oriental. Seria ele o responsável por classificar o país à Copa do Mundo de 1974, assim como levou o ouro olímpico em 1976. Permaneceria no cargo até 1981. Um dos destaques naquela campanha seria o atacante Helmut Müller, protagonista do Motor Jena até o início dos anos 1970. Ainda assim, os principais nomes eram os irmãos Roland e Peter Ducke. Ambos superaram os 300 jogos pela Oberliga e ganharam o prêmio de melhor jogador do país em anos consecutivos. Sete anos mais jovem, Peter ainda esteve presente na Copa de 1974.
O time mais forte da Alemanha Oriental na década de 1960 era o Vorwärts Berlim, inicialmente criado em Leipzig e fomentado pelo exército. A equipe da capital conquistou seis títulos entre 1958 e 1969, caindo no ostracismo por conta do fortalecimento do Dynamo Berlim, que provocou sua mudança para a cidade de Frankfurt (Oder) em 1971. Antes da transferência, o Vorwärts disputou oito edições das copas europeias, com destaque à caminhada até as quartas de final da Champions em 1969/70.
O Vorwärts começou despachando o Panathinaikos, que chegaria à decisão continental na temporada seguinte. Os alemães-orientais venceram por 2 a 0 em casa e saíram satisfeitos com o empate por 1 a 1 em Atenas. Logo depois, a vítima seria o Estrela Vermelha, com triunfo por 2 a 1 em Berlim e a classificação graças aos gols fora nos 3 a 2 do Marakana. O único capaz de eliminar o time do exército seria mesmo o Feyenoord, campeão naquela temporada. Os berlinenses ganharam por 1 a 0 em casa, no Estádio Walter Ulbricht sob neve. Todavia, a equipe de Ernst Happel reverteu a situação com os 2 a 0 em Roterdã, com gols de Ove Kindvall e Henk Wery.
Autor do tento da vitória sobre o Feyenoord e também carrasco do Panathinaikos, Jürgen Piepenburg se sobressaiu na campanha. Horst Begerad também foi outro nome decisivo contra o Estrela Vermelha. Já entre os jogadores mais relevantes da equipe estavam Jürgen Nöldner, Gerhard Körner, Otto Frässdorf e Eric Hamann – todos com passagens duradouras pela seleção, este último presente na Copa de 1974. Nöldner ainda foi eleito o melhor jogador em atividade no país em 1966. Conhecido como o “Puskás da Alemanha Oriental”, ele cresceu sem o pai, morto pelos nazistas por fazer parte da resistência.
Nove anos depois daquela campanha inesquecível na Recopa Europeia, o Carl Zeiss Jena reapareceu com força na Copa dos Campeões. Ainda treinado por Georg Buschner, o clube havia passado por uma transformação interna a partir de 1966. E, com um investimento forte especialmente pela parceria com a indústria, poderia buscar reforços para crescer. A partir do final dos anos 1960, o governo criou uma elite de 11 equipes pelo país, com passe livre para recrutar jovens promessas de qualquer parte do território – em panelinha reduzida para seis agremiações ao final da década seguinte. Assim, petrificou-se as potências e os times passaram a concentrar talentos entre si. Foi desta forma que o Carl Zeiss e os demais representantes da DDR despontaram além das fronteiras.
O time havia aparecido bem na Taça das Cidades com Feiras em 1969/70, capaz de eliminar o Cagliari de Gigi Riva e de vencer o Ajax de Johan Cruyff, apesar da queda para os Godenzonen nas quartas de final. Campeão nacional em 1969/70, o Carl Zeiss Jena também faria bonito na Champions. Foram duas vitórias sobre o Fenerbahçe, incluindo uma goleada por 4 a 0 em Istambul. Também venceram as duas diante do Sporting, ambas com placar de 2 a 1. E a vaga na semifinal até parecia mais perto, com os 3 a 2 para cima do Estrela Vermelha no Ernst Abbe. Contudo, o forte time de Miljan Miljanic aplicaria uma goleada por 4 a 0 em Belgrado, encerrando o sonho dos germânicos.
Os irmãos Peter e Roland Ducke permaneciam como referências do Carl Zeiss Jena, titulares ao longo daquela Champions. O zagueiro Lothar Kurbjuweit está entre os maiores nomes do clube, enquanto o meio-campista Harald Irmscher foi outro que frequentemente aparecia nos jogos da seleção. De qualquer maneira, o craque na época era Eberhard Vogel, considerado um dos maiores atacantes da história da Oberliga. Foi o melhor do país em 1969 e acumulou 74 partidas com a equipe nacional.
O Dynamo Berlim foi um clube criado por imposição da Stasi, a polícia secreta da Alemanha Oriental, em 1954. As autoridades simplesmente resolveram transferir o Dynamo Dresden campeão em 1953 para a capital, ignorando a torcida e negando a tradição do futebol na cidade. Mesmo com a mudança, o clube berlinense não virou uma potência de imediato. Também não se tornaria necessariamente forte com a saída do Vorwärts rumo a Frankfurt (Oder). Apesar disso, emplacou uma boa campanha até as semifinais da Recopa Europeia de 1971/72.
A caminhada começou contra o Cardiff City. Foram dois empates por 1 a 1, até a classificação do Dynamo nos pênaltis. O Beerschot seria um adversário mais tranquilo, após duas vitórias dos germânicos por 3 a 1, inclusive na Bélgica. Também não teriam trabalho para bater o Atvidabergs, com o triunfo por 2 a 0 na Suécia, antes dos 2 a 2 em Berlim. A queda viria diante do Dynamo Moscou de Konstantin Beskov. Os dois times empataram ambos os duelos por 1 a 1 e, desta vez, os pênaltis não ajudaram os alemães-orientais. Os soviéticos chegaram à final, na qual acabaram derrotados pelo Rangers.
O artilheiro Wolf-Rüdiger Netz era a grande figura do clube no período, passando dos 100 gols pela Oberliga e balançando as redes quatro vezes naquela Recopa. O meia Frank Terletzki era jovem na época, mas ganharia experiência para integrar os sucessos a partir dos anos 1980. Mas ainda não se via uma equipe de projeção nacional, limitada na década de 1970 a participações na Copa da Uefa – embora chegando a segurar um empate por 0 a 0 contra o Liverpool de Bill Shankly em uma das eliminações.
A grande campanha da Alemanha Oriental nas copas europeias foi do Magdeburgo. O clube possui suas origens ainda no Século XIX, mas demorou a se estabilizar após a criação da Alemanha Oriental. Esteve atrelado a diversos setores da economia – incluindo a siderurgia, a indústria e a construção civil. Em 1965 é que os alviazuis começaram a andar pelas próprias pernas, incluídos naquele grupo de clubes de elite para recrutar jogadores, pela representatividade da região onde estavam inseridos. E foi também na década de 1960 que a força do futebol se tornou explícita, com o time enfileirando taças nas copas nacionais.
O melhor momento do Magdeburgo aconteceu no início da década de 1970. Os alviazuis foram três vezes campeões da Oberliga entre 1972 e 1975, enquanto faturaram a Pokal no único ano em que a taça da liga não veio. Pois foi esta conquista em 1972/73 que se tornaria maior na temporada seguinte, com a participação histórica dos alemães-orientais na Recopa Europeia. Base principal da seleção que disputou a Copa de 1974, o clube alcançaria uma façanha inigualável aos seus compatriotas.
O Magdeburgo já tinha esboçado uma surpresa em outros momentos, dando trabalho a fortes times de West Ham (Recopa de 1965/66) e Juventus (Champions de 1972/73), mas nada comparável ao que ocorreria em 1973/74. A largada da campanha na Recopa seria suave, com a classificação em cima do NAC Breda, após empate por 0 a 0 na Holanda e vitória por 2 a 0 no Estádio Ernst Grube. O Baník Ostrava ameaçaria os alviazuis nas oitavas, ao ganhar na Tchecoslováquia por 2 a 0, mas a equipe virou em casa por 3 a 0 na prorrogação. E os germânicos despacharam nas quartas o Beroe, com os 2 a 0 em seus domínios tranquilizando para o empate por 1 a 1 na Bulgária. A semifinal traria um oponente bem mais tradicional, o Sporting. Em Lisboa, os alemães arrancaram o empate por 1 a 1. E comemoraram a vaga na decisão com os 2 a 1 diante de sua torcida.
A final daquela edição aconteceu no Estádio De Kuip, em Roterdã. Pela frente estaria o Milan, treinado pelo ainda jovem Giovanni Trapattoni, com parte do elenco que conquistou a Champions cinco anos antes. Gianni Rivera era a estrela da companhia, com colegas do porte de Aldo Maldera e Karl-Heinz Schnellinger. Nada que intimidasse o Magdeburgo. Um gol contra de Enrico Lanzi abriu o placar no primeiro tempo. Já na etapa complementar, Wolfgang Seguin determinou o triunfo por 2 a 0. O goleiro Ulrich Schulze fez boas defesas, embora Pierluigi Pizzaballa também tenha evitado uma goleada do outro lado.
O principal jogador da campanha era Jürgen Sparwasser, um dos melhores atacantes da Alemanha Oriental em todos os tempos. Ícone do Magdeburgo, fez gols importantes na campanha e também balançaria as redes da Alemanha Ocidental na histórica vitória durante a Copa de 1974. Melhor jogador do país em 1975, Jürgen Pommerenke foi outro essencial tanto no clube quanto na seleção durante aquele período, atuando no meio-campo. Já na ponta, quem aparecia com destaque era Martin Hoffmann, mais um presente no Mundial de 1974. A legião alviazul na seleção era completada por Wolfgang Seguin. O comando era de Heinz Krügel, que permaneceu no cargo de 1966 a 1976.
O Magdeburgo teve duas quartas de final da Copa da Uefa e uma da Recopa até 1980, chegando a eliminar o Schalke 04 em uma dessas campanhas. O outro grande episódio do clube, de qualquer forma, aconteceu na Champions de 1974/75. Os campeões da Recopa encararam logo de cara o Bayern de Munique, vencedor do principal torneio no ano anterior. No Estádio Olímpico, os alviazuis abriram dois gols de vantagem, mas tomaram a virada por 3 a 2. Já no reencontro na Alemanha Oriental, membros da Stasi levaram a Heinz Krügel as instruções que Udo Lattek havia passado aos jogadores bávaros durante o intervalo. O técnico se negou a recebê-las, fiel à sua ética. Os visitantes avançaram com o triunfo por 2 a 1 e, dois anos depois, Krügel seria destituído de seu cargo.
Enquanto o Magdeburgo entrava para a história da Recopa, o Lokomotive Leipzig também protagonizou uma campanha marcante na Copa da Uefa. Formado a partir do tradicionalíssimo VfB Leipzig, campeão alemão por três vezes entre 1903 e 1913, o Loko estava ligado à companhia ferroviária da Alemanha Oriental. E, embora não tenha conquistado a Oberliga, faria sucesso especialmente nas copas nacionais a partir dos anos 1970. Assim, não chegou a disputar a Champions, mas bateu cartão nos torneios secundários da Uefa e também ganharia fama internacional graças aos bons desempenhos.
Seria uma campanha especialmente marcante pela forma como o Lokomotive Leipzig bateu de frente com adversários das grandes ligas. A começar pelo Torino, derrotado tanto na ida quanto na volta por 2 a 1 – com Claudio Sala e Paolo Pulici do outro lado. Depois os alemães-orientais encarariam o Wolverhampton e enfiaram 3 a 0 no Zentralstadion, despachando os Lobos graças ao gol fora nos 4 a 1 do Molineux. E os entraves políticos não foram sentidos diante do Fortuna Düsseldorf, com a derrota por 2 a 1 no lado ocidental sendo superada pelos 3 a 0 do lado oriental.
Já nas quartas, o Ipswich Town de Sir Bobby Robson fez 1 a 0 em casa, placar retribuído na volta, com a passagem dos alemães nos pênaltis. Somente na terceira viagem à Inglaterra é que derrubaram os auriazuis. O Tottenham de Bill Nicholson contou com a experiência de Martin Peters para ganhar as duas. A vitória por 2 a 1 dos Spurs dentro da Alemanha Oriental seria complementada pelos 2 a 0 em White Hart Lane. Todavia, os londrinos perderiam a decisão para o Feyenoord.
O Lokomotive Leipzig tinha uma base sólida, com oito titulares presentes em todas as dez partidas da campanha na Copa da Uefa. O ponta Wolfram Löwe anotou quatro gols e disputaria a Copa de 1974, enquanto Hans-Bert Matoul repetiu o número de tentos na campanha continental e acabaria ainda como artilheiro da Oberliga naquela temporada. O veterano atacante Henning Frenzel não disputaria o Mundial, mas foi nome frequente na seleção ao longo dos anos 1960 e aparece entre os maiores artilheiros da história do Lokomotive.
Se você gosta de automobilismo, talvez o nome do Sachsenring Zwickau lhe soe familiar. Não é coincidência: o clube levava a alcunha da pista de Sachsenring, o principal circuito automotivo da Saxônia, e estava atrelado à indústria automotiva. O time de futebol existia antes disso e foi, inclusive, o primeiro campeão da Oberliga em 1949/50. Na época, o clube estava ligado a associações de trabalhadores e a decisão contra o Dresden Friedrichstadt foi usada como propaganda política – por conta da relação do Dresden com o antigo clube “burguês” da cidade, que dominava o Campeonato Alemão nos últimos tempos do Reich. Numa decisão em que a violência não foi coibida pelos árbitros, o Zwickau goleou por 5 a 1, contra oito adversários ao final da partida.
Esse passado já era bem distante em 1975/76 e nunca mais o Zwickau havia conquistado a Oberliga. Entretanto, o título na Copa da Alemanha Oriental garantiu a vaga na Recopa Europeia, rendendo uma campanha belíssima. O Panathinaikos treinado por Aymoré Moreira seria o primeiro eliminado, com empate por 0 a 0 na Grécia e vitória por 2 a 0 em Zwickau. O sarrafo aumentou diante da Fiorentina, com o triunfo por 1 a 0 do time de Carlo Mazzone no Artemio Franchi, mas com troco na mesma moeda na Alemanha Oriental. A classificação viria nos pênaltis, por 5 a 4. E o maior feito ocorreria nas quartas.
O Celtic poderia não ser a potência de outros tempos, mas Jock Stein estava no banco, assim como Kenny Dalglish no ataque. O empate por 1 a 1, arrancado no final do duelo em Parkhead, vinha de bom tamanho ao Zwickau. E os germânicos celebrariam a vitória por 1 a 0 em casa, que os colocou na semifinal. Só então seriam desbancados, com dois triunfos do Anderlecht, por 3 a 0 na Alemanha e por 2 a 0 na Bélgica. François van der Elst e Rob Rensenbrink se encarregaram dos gols aos futuros campeões. O Sachsenring Zwickau sequer voltaria aos torneios da Uefa depois disso.
O sucesso da equipe naquela campanha tinha nome e sobrenome: Jürgen Croy. O goleiro foi o maior de sua posição na história da Alemanha Oriental e também era considerado entre os melhores da Europa nos anos 1970 – a ponto de figurar nas eleições da Bola de Ouro no período. O goleiro titular dos alemães-orientais na Copa de 1974 seria por três vezes eleito o melhor jogador do país, inclusive em 1976 – quando também levou o ouro olímpico. Nascido em Zwickau, nunca atuou por outro clube na carreira. Nenhum outro titular daquela equipe semifinalista da Recopa chegaria à seleção, o que ressalta a preponderância do arqueiro.
Localizado em uma das cidades mais tradicionais do futebol na Alemanha, o Dynamo Dresden enfrentou altos e baixos ao longo de sua história. Foi o clube mais importante da Oberliga, mas precisou lidar com os seguidos desmanches e perseguições das autoridades. O antigo Dresdner SC, potência do Reich, foi desmantelado como “clube burguês” e os jogadores fugiram ao lado ocidental – incluindo Helmut Schön, futuro técnico campeão do mundo em 1974. Já nos anos 1950, mesmo com o Dynamo sendo fomentado pela Stasi, aconteceria a supracitada transferência a Berlim para a criação do Dynamo da capital.
O Dynamo Dresden precisou se reconstruir a partir das divisões de acesso e retornou à elite nos anos 1960, até voltar a disputar a taça seriamente na década de 1970. E, como uma das equipes mais fortes do país, bateria cartão na Champions. A campanha de 1973/74 seria marcante, ainda que encerrada nas oitavas. Os alemães-orientais eliminaram a Juventus, antes de darem um trabalho imenso ao poderoso Bayern de Munique. O time chegou a terminar o primeiro tempo com a vitória parcial no Estádio Olímpico, antes de ceder a virada por 4 a 3. Cairia apenas com um empate por 3 a 3 em casa. E a Champions de 1976/77 selaria a volta ao cenário continental em grande estilo.
O Dynamo Dresden começou aquela Champions eliminando o Benfica. Venceu por 2 a 0 no Dynamostadion, antes de segurar o empate sem gols no Estádio da Luz. Depois a classificação viria para cima do Ferencváros, apesar da derrota por 1 a 0 na Hungria. A goleada por 4 a 0 na Alemanha evitaria qualquer preocupação. Por fim, a equipe acabaria eliminada pelo Zurique, que fez 2 a 1 na Suíça e se valeu de seus dois tentos nos 3 a 2 fora. O Dynamo desperdiçou uma excelente oportunidade de medir forças com um poderoso Liverpool.
O técnico Walter Fritzsch seria o grande mentor por trás do sucesso do Dynamo Dresden nos anos 1970. Dentro de campo, contava com vários jogadores frequentes na seleção. Gert Heidler, Hartmut Schade, Reinhard Häfner e Gerd Weber eram nomes recorrentes nas convocações. Nenhum deles com a magnitude de Hans-Jürgen Kreische, artilheiro por quatro vezes da Oberliga e eleito o melhor do país em 1973. O atacante vestia a camisa 10 na Copa de 1974 e figura em qualquer lista de craques do lado oriental.
Tricampeão nacional no fim dos anos 1970, o Dynamo Dresden ganharia sua chance de encarar o Liverpool nas oitavas da Champions 1977/78, mas foi eliminado com a derrota por 5 a 1 em Anfield, mesmo ganhando a volta por 2 a 1. O time iria um pouco melhor em 1978/79, quando repetiu a caminhada até as quartas de final. Antigo jogador do clube, Gerhard Prautzsch havia assumido o cargo como treinador.
A derrota por 2 a 0 na estreia contra o Partizan Belgrado seria rebatida com os 2 a 0 na Alemanha Oriental e a classificação nos pênaltis. Depois, a vida nas oitavas seria mais fácil, contra os irlandeses do Bohemian. O empate por 0 a 0 em Dublin se seguiu por uma goleada categórica por 6 a 0 no Dynamostadion. Já a eliminação aconteceu diante de um respeitável Austria Viena, que emplacou 3 a 1 na ida, dentro do Praterstadion. O triunfo por 1 a 0 na volta não evitaria a decepção dos alemães-orientais.
A base da equipe seria diferente, sobretudo pela aposentadoria do craque Hans-Jürgen Kreische. Menos utilizado nos jogos em 1976/77, o protagonista seria Hans-Jürgen Dörner. O líbero é outro a ser considerado um dos maiores da história da Alemanha Oriental, muitas vezes equiparado como um “Franz Beckenbauer do leste”. Capitão do Dynamo a partir de 1977, conquistou por três vezes o prêmio de melhor do ano no país e se tornaria recordista em aparições pela seleção, faturando o ouro olímpico em 1976. Futuro ídolo do clube, Andreas Trautmann também começava a despontar no meio-campo.
Quando o Dynamo Dresden conquistou o tricampeonato nacional, recebeu nos vestiários a visita de Erich Mielke, chefão da Stasi – a polícia secreta da Alemanha Oriental. Apesar dos parabéns, os jogadores ouviram que “estava na hora do Dynamo Berlim começar a vencer”. Pois foi o que aconteceu. Se as artimanhas anteriores não resolviam, Mielke insistia em criar uma superpotência na capital. E isso se daria não só com bons jogadores, mas com benefícios ilimitados, sobretudo da arbitragem. Assim, o Dynamo Berlim viraria decacampeão.
O protecionismo não tornou o Dynamo popular na cidade, assim como alimentou o ódio dos rivais na Alemanha Oriental. E, apesar do clima intimidatório, não seria esse apadrinhamento da Stasi que garantiria o sucesso continental na Champions. A média de desempenho é relativamente fraca, com apenas duas campanhas até as quartas de final neste decênio. A primeira delas aconteceu em 1979/80, em sua estreia no certame, quando a situação privilegiada dos berlinenses ainda era relativamente nova aos olhos do restante da Europa.
O Dynamo Berlim se impôs principalmente como mandante na Champions 1979/80. Goleou o Ruch Chorzów por 4 a 1 na ida, antes do empate por 0 a 0 na Polônia. Fez o dever também com os 2 a 1 sobre o Servette, segurando o empate por 2 a 2 na Suíça. Só não resistiria ao atual campeão continental, o Nottingham Forest de Brian Clough. Os berlinenses conseguiram arrancar o triunfo por 1 a 0 no City Ground, o que certamente animou a Stasi. Desabaram em pleno Friedrich Ludwig Jahn Sportpark, com a derrota por 3 a 1. Trevor Francis fez dois gols e John Robertson anotou o terceiro aos 39 do primeiro tempo.
Jürgen Bogs era o treinador do Dynamo naquela campanha e seria o responsável por todo o decacampeonato. Herói na Recopa de 1972, Wolf-Rüdiger Netz permanecia como uma figura importante, assim como Frank Terletzki havia subido na hierarquia. O goleiro Bodo Rudwaleit e o zagueiro Norbert Trieloff eram outras figuras notáveis, presentes em diversas partidas da seleção. E o herói da campanha era o atacante Hans-Jürgen Riediger, que balançou as redes no City Ground, gravando-se como um personagem notável na transição dos berlinenses como força hegemônica na Oberliga.
A hegemonia nacional do Dynamo Berlim acabava ocultando o bom trabalho que outros clubes faziam na Alemanha Oriental. Assim, um caminho para apresentarem sua força era justamente nas copas europeias. O Carl Zeiss Jena esteve a um triz de repetir o feito do Magdeburgo na Recopa, caindo apenas na decisão contra o Dinamo Tbilisi. Mesmo assim, seria um desempenho marcante pelo altíssimo nível dos adversários derrubados pelo clube da indústria óptica.
O começo não seria fácil. A Roma de Nils Liedholm enfiou 3 a 0 no Estádio Olímpico logo na abertura da competição, com Falcão deixando sua marca. Pois o Carl Zeiss Jena arrancou a histórica virada por 4 a 0, ajudado por uma expulsão entre os italianos logo no início do segundo tempo. Já na segunda fase, o oponente seria o Valencia, com Mario Kempes e Fernando Morena no ataque. A vida dos alemães ficou tranquila com os 3 a 1 no Estádio Ernst Abbe, o que permitiu a derrota por 1 a 0 na volta dentro do Mestalla.
Nas quartas de final, o Newport County foi um adversário mais cascudo do que se imaginava. Arrancou o empate por 2 a 2 aos 45 do segundo tempo na Alemanha e caiu com o 1 a 0 chorado do Carl Zeiss Jena em Gales. E o Benfica do atacante Nenê fazia o varal entortar de novo na semifinal, com outra camisa pesada. Os germânicos garantiram os 2 a 0 na ida, gordura que valeu diante da derrota por 1 a 0 na Luz. A decisão em Düsseldorf podia sugerir um duelo alternativo contra o Dinamo Tbilisi, mas vale lembrar que a base da seleção soviética estava ali, com jogadores que disputariam a Copa de 1982 – a exemplo de Aleksandr Chivadze, Ramaz Shengelia e Vitali Daraselia. O Carl Zeiss até abriu o placar, mas o Dinamo buscou a virada por 2 a 1 e ficou com a taça graças a um tento de Daraselia aos 41 do segundo tempo.
Hans Meyer foi o assistente de Georg Buschner no clube e assumiria o posto de treinador principal, permanecendo no cargo de 1971 a 1983. Depois ainda dirigiria times do lado ocidental, sobretudo o Borussia Mönchengladbach após a queda do Muro. Andreas Bielau e Gerhardt Hoppe foram dois jogadores decisivos na fase final da competição, mesmo sem tanta projeção além do clube. A liderança técnica permanecia com Eberhard Vogel. O goleiro Hans-Ulrich Grapenthin também era brilhante naquela época, eleito o melhor jogador do país em 1980 e 1981, protegido na zaga pelo veterano Lothar Kurbjuweit. O atacante Jürgen Raab e o líbero Rüdiger Schnuphase foram outros dois que se tornaram lendas em Jena, ambos superando as 300 aparições e os 100 gols pela Oberliga. Schnuphase foi eleito ainda o melhor em atividade no país em 1982.
O Dynamo Berlim seguia batendo cartão na Champions e caindo cedo, por mais que os sorteios não ajudassem tanto assim. O clube vinha de eliminações diante do Baník Ostrava, do Aston Villa e do Hamburgo nas edições anteriores – os dois últimos acabaram com o troféu continental no respectivo ano. De realmente positivo, havia uma classificação diante do Saint-Étienne em 1981/82, o que parecia pouco diante da exigência da Stasi sobre a equipe. Em 1983/84, ao menos, os berlinenses reergueriam um pouco seu moral.
Pegar o Jeunesse Esch foi a tranquilidade que o Dynamo tanto esperava. Venceu por 4 a 1 em Berlim e repetiu o triunfo com os 2 a 0 em Luxemburgo. A passagem às quartas veio em cima do Partizan Belgrado de Milos Milutinovic – irmão mais velho de Bora, que teve uma carreira mais consistente como jogador. Os berlinenses fizeram 2 a 0 em casa, satisfeitos com a derrota por 1 a 0 em Belgrado. A queda aconteceu diante da Roma de Nils Liedholm. Com Falcão em campo, os giallorossi enfiaram 3 a 0 no Estádio Olímpico, com Toninho Cerezo fechando a conta. Na volta, nada de romada: a vitória por 2 a 1 não bastou aos anfitriões em Berlim.
Os destaques do time treinado por Jürgen Bogs não mudavam muito em relação a quatro anos antes, com a tarimba de Netz e Terletzki. Um nome importante a despontar foi o atacante Rainer Ernst, titular da seleção nos anos 1980 e que chegaria a passar por clubes da Europa Ocidental após a queda do Muro de Berlim – como Kaiserslautern, Bordeaux e Cannes. Frank Rohde foi outro a seguir caminho parecido, defendendo Hamburgo e Hertha Berlim na Bundesliga. Falko Götz fugiu à Alemanha Ocidental antes da reunificação, virando nome importante especialmente no Bayer Leverkusen, com o qual conquistou a Copa da Uefa em 1988. E Andreas Thom, autor do gol da vitória contra a Roma, começava a chamar atenção. O jovem atacante viraria um dos mais cobiçados após o fim do regime comunista e sairia a peso de ouro ao Leverkusen, ainda que sem repetir o sucesso dos tempos de Dynamo.
Nas edições seguintes da Champions, o Dynamo Berlim nunca foi além das oitavas. Caiu diante de Austria Viena (duas vezes), Brondby, Bordeaux e Werder Bremen – num jogo significativo, meses antes da queda do Muro de Berlim. O clube também estaria na Recopa em 1989/90, superado pelo Monaco logo na segunda eliminatória.
Assim como o Carl Zeiss Jena, o Lokomotive Leipzig precisou de um caminho alternativo para se projetar nas copas europeias, diante do domínio do Dynamo Berlim na Oberliga. Os auriazuis faziam boas campanhas na liga nacional, mas precisavam de um atalho com a Pokal. Foram três títulos na década de 1980, o que garantiu sua sequência nos torneios continentais. O Lok chegou a derrotar o Barcelona na Recopa de 1981/82, apesar da eliminação nas quartas de final. Também despachou Bordeaux e Werder Bremen na Copa da Uefa. Mas nada comparado ao sucesso na Recopa de 1986/87.
A jornada começou com o empate por 1 a 1 diante do Glentoran, na Irlanda do Norte, com os 2 a 0 da classificação em Leipzig. O Rapid Viena representou um obstáculo maior nas oitavas, com novo empate por 1 a 1 na Áustria, até o alívio pelos 2 a 1 na prorrogação da Alemanha. O Lokomotive abriu o caminho nas quartas ao superar o Sion por 2 a 0, antes de segurar o placar zerado na Suíça. E tamanho do feito ficaria claro com a classificação sobre o Bordeaux de Aimé Jacquet na semifinal. Os alemães-orientais venceram já no Chaban-Delmas por 1 a 0. O Zentralstadion lotou suas arquibancadas para o reencontro, com o troco dos girondinos por 1 a 0. Então, nos pênaltis, a vaga na final seria ratificada pelos anfitriões com o triunfo por 6 a 5.
A alegria do Lokomotive Leipzig não duraria tanto assim na decisão. Afinal, à sua frente em Atenas estaria o Ajax, treinado por Johan Cruyff. Uma geração excelente despontava nos Godenzonen, com Marco van Basten e Frank Rijkaard se tornando referências, mas também jovens da estirpe de Dennis Bergkamp e Aron Winter. Às vésperas de se transferir ao Milan, Van Basten se despediu da torcida com um gol de cabeça que selou a vitória por 1 a 0 e deu o título continental aos holandeses.
O treinador do Leipzig era Hans-Ulrich Thomale, que fez uma carreira basicamente limitada ao bom trabalho no clube. O goleiro René Müller foi o principal da posição no país nos anos 1980, eleito o melhor jogador em atividade na Alemanha Oriental em duas temporadas. O zagueiro Matthias Lindner, o líbero Frank Baum, o meia Heiko Scholz e o atacante Dieter Kühn pintavam na seleção alemã-oriental com frequência. O lateral Ronald Kreer e o meio-campista Matthias Liebers se consagraram como principais referências do clube nos anos 1980, superando os 50 jogos pela equipe nacional. Já a estrela em ascensão era o centroavante Olaf Marschall, que faria uma carreira respeitada no Kaiserslautern e disputaria até Copa do Mundo após a reunificação da Alemanha.
Quando o Dynamo Berlim ruiu, em meio à derrocada do regime da Alemanha Oriental, o Dynamo Dresden despontou como novo dono da taça na Oberliga. Não era sem razão: o clube formou uma das gerações mais talentosas do país naquele momento, com jogadores que foram campeões continentais nas competições de base com a seleção e deixaram a equipe nacional próxima da Copa do Mundo outra vez. Dentro de casa, esta base do Dynamo faturou o bicampeonato da liga. Fora do país, ainda teve aparições dignas. Foram duas campanhas até as quartas de final da Recopa nos anos 1980, antes de alcançar as semifinais da Copa da Uefa em 1988/89. A garotada era comandada por Reinhard Häfner, nome importante do time tricampeão dos anos 1970.
O Dynamo Dresden deu partida em sua jornada eliminando o Aberdeen, com vitória por 2 a 0 na Alemanha e empate por 0 a 0 na Escócia. A segunda fase guardou dois jogos contra o Waregem. A goleada por 4 a 1 no Dynamostadion facilitou a vida e fez com que a equipe relaxasse na derrota por 2 a 0 da volta. A Roma parecia um obstáculo maior nas oitavas, com Rudi Völler e Giuseppe Giannini entre suas estrelas. O Dresden venceu as duas por 2 a 0. A motivação cresceu nas quartas, com direito à goleada por 4 a 0 na volta diante do Victoria Bucareste, após o 1 a 1 na Romênia. E eis que viria uma viagem à Alemanha Ocidental.
O outro semifinalista era o Stuttgart, treinado pelo holandês Arie Haan. Jürgen Klinsmann era o astro dos suábios na época, em timaço que ainda reunia Eike Immel, Srecko Katanec, Guido Buchwald, Maurizio Gaudino e outros bons jogadores. Karl Allgöwer permitiu a vitória por 1 a 0 dos alvirrubros no Neckarstadion e a eliminação do Dynamo foi selada em Dresden, com os visitantes buscando o empate por 1 a 1. Seria mais um jogo de peso pouco antes da queda do Muro de Berlim. E o Stuttgart acabaria por fisgar um dos destaques adversários quando o mercado se reabriu, graças às conversas firmadas desde aquele embate.
Matthias Sammer era essa promessa. O craque costumava atuar em posições mais ofensivas e fazia sucesso, tanto no clube quanto na seleção. Não à toa, virou um dos mais cobiçados no elenco do Dresden. A situação de Ulf Kirsten era parecida, especialmente após os cinco gols anotados naquela Copa da Uefa. O centroavante seguiria pouco depois ao Bayer Leverkusen, onde se tornou uma lenda. Com seis gols, Torsten Gütschow foi o artilheiro do torneio continental e, um pouco mais velho, seguiu ao Galatasaray posteriormente. Dos mais jovens, Ralf Hauptmann ainda faria carreira no Colônia. Mas vale dizer, também, que aquele Dynamo tinha uma velha guarda do próprio clube – recheada de jogadores importantes à seleção nos anos 1980. Andreas Trautmann, Hans-Uwe Pilz, Matthias Döschner, Jörg Stübner e Ralf Minge davam essa consistência. Trautmann seria o jogador do ano na Alemanha Oriental em 1989.
A reunificação da Alemanha se oficializou em 3 de outubro de 1990. Assim, o Dynamo Dresden disputou sua última edição da Champions como o representante de um país que não existia mais – e aconteceria o mesmo com o Hansa Rostock, uma temporada depois. Naquele momento, o time bicampeão se desmanchava, com a saída das principais promessas à Bundesliga e ainda de alguns veteranos ao oportunista Fortuna Colônia. Apesar disso, o Dresden pôde manter seu orgulho com bom papel no cenário continental.
A equipe havia decepcionado em 1989/90, eliminada pelo AEK Atenas logo de cara. A recuperação aconteceu na campanha seguinte. Logo na primeira fase, duas vitórias por 3 a 1 derrubaram o fraco Union Luxemburgo. O Malmö de Bob Houghton apareceu na etapa seguinte e seria uma real ameaça. As duas partidas acabaram com o empate por 1 a 1. Então, dentro da própria Suécia, o Dresden se impôs nos pênaltis. O fim da linha aconteceria nas quartas de final, contra o esquadrão do Estrela Vermelha que seria campeão europeu em 1991. A derrota por 3 a 0 no Marakana (gols de Prosinecki, Binic e Savicevic) havia sido um golpe duro aos germânicos. Já na volta, apesar da vantagem logo aos três minutos para os alemães, Savicevic e Pancev viraram aos alvirrubros. Logo começou a confusão nas arquibancadas, com objetos atirados no gramado, e o duelo nem terminou. A derrota por 2 a 1 virou um 3 a 0 nos tribunais da Uefa.
Autor de cinco gols, Gütschow carregou o Dynamo Dresden naquela campanha. Também permaneciam nomes como Andreas Trautmann e Heiko Scholz. De qualquer forma, se as vendas de Sammer e Kirsten geraram uma fortuna, o clube também aproveitou para fazer a rapa em outros clubes menores da Alemanha Oriental sem poder aquisitivo. Foi assim que chegaram Detlef Schössler e Uwe Rösler. O Dynamo conseguia até atrair atletas em atividade do lado oriental, contratando Sergio Allevi do Kaiserslautern. Seria o último lampejo de um país à beira da extinção.
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