FNV Sports
·23 de abril de 2020
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·23 de abril de 2020
Após o “Maracanazo” de 1950, a Seleção do Uruguai cintilou novamente “El Sol de Mayo” em uma Copa do Mundo apenas esporadicamente, logrando apenas algumas classificações, mas quase nunca atingindo às fases mais agudas. Mesmo sem resultados expressivos, o pequeno país foi berço de craques como Pedro Rocha, Rodolfo Rodríguez, Fernando Morena e de um “El Flaco” que extasiou o mundo da bola por mais de uma década: Enzo Francescoli, o qual, na próxima sexta-feira, 24 de abril, comemora 37 anos de sua estreia com a camisa do River Plate.
Dotado de uma técnica singular, capaz de harmonizar uma compreensão exímia dos espaços dentro das quatro linhas, seja através de rápidos dribles curtos ou passes rompedores de linhas, com a frieza dos matadores mais implacáveis da história do futebol, Francescoli foi o ser mais celestial de “La Celeste Olímpia” entre os anos de 1980 e 1990.
Natural da capital uruguaia, Montevidéu, Enzo contrasta com as figuras anteriormente citadas. Isso porque jamais atuou nos gigantes Nacional e Peñarol. “Hincha” confesso de “Los Carboneros”, inventou-se a lenda de que, ainda na infância, ele teria sido negado depois de uma peneira no clube de coração. Em entrevista concedida à revista argentina “El Gráfico”, em 2018, Enzo esclareceu os fatos.
“Não é verdade. Fui a Las Acacias, e haviam 6 mil garotos. Passei a tarde inteira olhando, joguei 20 minutos. Havia passado do primeiro filtro. Na saída, disse ao meu pai: ‘Não sei se vou voltar, pai, outra vez para ficar assistindo eles jogarem a tarde inteira? Não quero’. E não fui”, disse.
Outro mito criado em torno do craque diz respeito ao homônimo uruguaio do River Plate, que teria recusado Enzo por ser muito franzino. O próprio, naquela mesma reportagem, desmentiu o mito:
“Disseram que me recusaram no River do Uruguai por ser magrinho. Mentira. Um dia fiz um teste no River, e fui convidado a voltar, mas faltei à peneira. Eu estudava em um Colégio Salesiano e ali fui campeão cinco anos consecutivos”, recordou.
No último do colégio, a equipe enfrentou o Montevideo Wanderers. Por lá, atuava Gustavo Raúl Perdomo, amigo de bairro de Francescoli. Ciente do talento do colega, passou a semana que antecedeu o confronto alertando seu técnico, José Maria Martiarena, para não tirar os olhos do jovem de apenas 14 anos.
“Essa partida aconteceu em 1976. Como Enzo havia jogado muito bem, eu disse a Perdomo que o trouxesse ao clube na metade da semana seguinte. Ele o levou em 22 de julho, e o fichamos imediatamente”, contou o ex-técnico ao portal argentino “Taringa!”
Talentoso desde cedo, aos sábados, quando costumeiramente eram realizados os compromissos da categoria, repunha as aulas perdidas durante a semana. Desse modo, seu pai, Ernesto Francescoli, o buscava para levar até o bairro de “Las Piedras”, onde os “canteranos” de “Los Bohemios” atuam até hoje. Essa “verdadeira excursão”, como caracteriza o próprio Francescoli, acarretava em alguns atrasos. Mesmo com um a menos, Martiarena dava o aval ao árbitro para iniciar a partida pois tinha discernimento da discrepância de Enzo para os demais.
“Na base, colocávamos Enzo em qualquer posição e ele respondia: de cinco, de oito, de nove. Nós precisávamos mudá-lo de posição porque éramos uma equipe pequena e não haviam jogadores suficientes. A diferente dele para o resto era notada imediatamente. Perdomo e ele eram dois cracks. Uma tarde, jogando contra Bella Vista, meteu um gol de bicicleta igual ao que fez depois contra a Polônia”, relembrou Martiarena.
Em 9 de março de 1980, Enzo Francescoli debutou profissionalmente pelo Montevideo Wanderers, que venceu, fora de casa, o Defensor Sporting, em partida válida pelo Torneo Colombes. Naquela temporada, “Los Vagabundos” obtiveram o vice-campeonato, melhor desempenho da equipe desde a conquista do título nacional, em 1931, ainda na era amadora do futebol local. A excepcional performance de Enzo rendeu-lhe inúmeras comparações com Juan Alberto Schiaffino. O campeão, vale ressaltar, foi o Nacional.
Com um estilo elegante, recebeu a alcunha de “El Príncipe”, em homenagem ao ex-atleta do Wanderers, Aníbal Ciocca. Outros dois hábitos que cultivou desde a adolescência foi o de fumar e de mascar chicletes no decorrer das partidas.
“Desde criança me dei conta de que com o chiclete tinha mais saliva e não ficava com a boca seca. Esse hábito me pegou tanto que, se não tinha um chiclete para mascar, entrava mal para jogar. Era melhor que tivesse chiclete”, falou Enzo Francescoli à “El Gráfico”
Apesar da segunda colocação, o Montevideo Wanderers não se habilitou para a disputa da Copa Libertadores de 1981. Explica-se: a segunda vaga uruguaia foi definida pelo vencedor da Liguilla pré-Libertadores, torneio disputado pelos times que ficavam entre a 2ª e a 7ª colocação. Assim, tanto em 1980 como em 1981, quando “Los Bohemios” terminaram atrás somente de Nacional e Peñarol, a equipe comandada por Enzo Francescoli sucumbiu na minicompetição.
Um ano após sua estreia como profissional, Francescoli compôs o plantel da Seleção do Uruguai que conquistou, no Equador, o Campeonato Sul-Americano Sub-20, no qual foi escolhido o melhor jogador. Pelo selecionado principal, estreou em 20 de fevereiro de 1982, na Índia, no empate por 2-2 sobre a Coréia Sul, em confronto válido por um torneio amistoso.
Em 1983, além de auxiliar na classificação à Copa Libertadores do Wanderers, que contava ainda com peças como Raúl Esnal, Jorge “El Chifle” Barrios, Luis Alberto “El Loco” Acosta, Francescoli, juntamente com seus companheiros de clube, sagraria-se campeão da Copa América, na qual foi decisivo.
Diferentemente do formato atual, a edição daquele ano não possuía sede fixa. Assim, os confrontos eram jogados no formato ida e volta. Após se classificar na primeira fase com três vitórias e uma derrota, o Uruguai avançou às semifinais, onde despachou o Peru, e se garantiu na final, contra o Brasil. No primeiro duelo, disputado em um estádio Centenário abarrotado, os donos da casa venceram por 2-0. O primeiro tento foi anotado por Enzo, de falta, que o considera como um dos mais importantes de sua carreira. Na Fonte Nova, o empate por 1-1 garantiu o 12ª troféu de Copa América do Uruguai, o primeiro título profissional da carreira de Francescoli.
Suas atuações despertaram o interesse do River Plate. Desse modo, imediatamente após o término da competição continental, o jovem de 22 anos desembarcou em Buenos Aires em troca de “míseros” 310 mil dólares. Sendo assim, em 24 de abril de 1983, no Monumental de Núñez, na vitória por 1-0 frente ao Huracán, “El Príncipe” estreou pelos “Millionarios”.
Apesar dos nove gols marcados, que lhe renderam a artilheira da equipe no Campeonato Metropolitano, o início de Enzo na Argentina foi árduo. Penúltimo na competição, o River não descendeu à B Nacional somente devido à restituição do sistema de “promedios”. Adotado até os dias atuais, a estratégia fez com que o clube de Núñez ficasse duas posições acima dos dois rebaixados, respectivamente, Nueva Chicago e Racing. Pressionado pelas expectativa, a “El Gráfico” chegou a questionar, na edição de 1º de novembro daquele ano, qual seria o verdadeiro Francescoli.
Bode expiatório daquele período ruim do River Plate, o uruguaio demorou a desabrochar. Apesar de finalista do Campeonato Nacional, competição na qual vigorava o sistema de mata-matas, o vice-campeonato para o modesto Ferro Carril Oeste, que venceu tanto na ida quanto na volta, foi um preto cheio para as críticos de Enzo.
Todavia tal cenário mudaria completamente no segundo semestre. Melhor adaptado após as chegadas de Nelson Guitiérrez, Antonio Alzamendi, Jorge Villazán e Carlos Berrueta, “El Princípe” decolou. Assim, além de terminar como artilheiro do Metropolitano, que transcorria no formato de pontos de corridos, tendo balançado as redes 24 vezes, foi eleito também o melhor jogador sul-americano de 1984. Mesmo assim, o River não levantou a taça, tendo terminado o campeonato na 4ª colocação, 11 pontos atrás do campeão Argentinos Juniors.
O bom desempenho chamou a atenção do América de Cali.
“Como não queria ir, pedi uma fortuna. Eu queria triunfar no River, tinha colocado isso na cabeça. Se tivesse ido, não haveria segunda passagem, nem idolatria, nem nada. A vida é assim, uma pequena pode terminar sendo a grande decisão de sua vida”, disse.
A decisão por seguir defendendo “Los Millionarios” viria a render-lhe frutos imensuráveis. Eliminado pelo Vélez Sarsfield no Nacional de 1985, o River Plate se colocou como postulante ao título do Campeonato Argentino do início ao final. Aliás, vale ressaltar, a temporada de 1985-86 foi marcada pela extinção dos dois antigos torneios e, consequentemente, pela implementação de um calendário à europeia na Argentina.
Com a chegada do ex-treinador do San Lorenzo, Héctor “El Bambino” Veira”. Enzo teve seu posicionamento modificado. Antes articulador, passou a atuar mais próximo do gol, como um camisa 9. Resultado: Francescoli encabeçou novamente a tabela dos artilheiros do certame, desta vez tendo anotado 25 gols. E mais, seu desempenho foi recompensado com o prêmio “Olimpia de Plata”, o equivalente argentino da Bola de Ouro brasileira. Essa foi a primeira vez que um estrangeiro recebeu tal premiação.
Contudo, o tento mais emblemático com a assinatura de “El Príncipe” se deu em um amistoso contra a estrelada Seleção da Polônia. Em preparação para a Copa do Mundo de 1986, os europeus foram convidados pelos cinco grandes clubes argentinos, que estavam com o calendário pausado, para disputar um torneio de verão, em janeiro daquele ano.
Mesmo não tendo a disposição nomes como Zbigniew Boniek, Władysław Żmuda, Józef Młynarczyk, em Mar del Plata, os poloneses venciam por 4-2. Então, faltando sete minutos para o apito final, Enzo diminuiu, ao passo que, imediatamente depois, Centurión igualou o marcador. Já nos acréscimos, Beto Alonso cobrou falta pela direita e encontrou Ruggeri que ajeitou de cabeça para a área, onde encontrou Francescoli, que matou no peito e emendou uma bicicleta perfeita de direita para estufar as redes e sacramentar a vitória de “Los Millionarios”.
“Um tempo antes havia feito uma (bicicleta) sem dominar a bola, com a de Crespo na Libertadores de 1996, contra o Huracán, mas bateu na trave. Também fiz vários gols de chaleira. Sempre me encantou fazer piruetas. Eu ficava depois do treino testando coisas. Antes se usava mais, agora estão rareando”, contou.
No retorno dos jogos oficiais, “El Príncipe” conduziu o River ao título argentino. Dessa maneira, em 9 de março, após derrotar, no Monumental de Núñez, o Vélez Sarsfield por 3-0, a equipe quebrou um tabu de cinco anos sem conquistadas e sagrou-se campeã do Campeonato Argentino de 1985/86. Em 6 de abril, além de vencer o Boca Juniors por 2-0, o River Plate deu a volta olímpica em plena La Bombonera.
O sucesso no clube, entretanto, não se repetiu na Seleção do Uruguai. Na Copa do México, mesmo com a classificação às oitavas de final, quando os campeões da Copa América de 1987 seriam eliminados pela Argentina, Enzo passou vergonha.
“Foi no 6-1 para a Dinamarca. Jamais nós demos conta que estávamos fazendo um papelão. Tínhamos que ter fechado a casinha e perder de 3-1. Eu faço o 1-2 e saiu correndo para buscar a bola, dizendo: ‘Vamos que empatamos’. Levamos um baile e não nós demos conta. Nunca mais me aconteceu. Somente por isso pediria perdão a todos os uruguaios”, revelou.
Às vésperas da Copa do México, em 11 de maio, o uruguaio foi comprado por 4 milhões de dólares pelo recém-promovido Racing Paris.
Mesmo sofrendo uma decadência desde a década de 1950, acentuada ainda mais pelo primeiro título francês, conquistado em 1985, do Paris Saint-Germain, a nova equipe do uruguaio era, até então, a mais relevante de Paris. Dessa maneira, a Matra decidiu patrocinar o clube. Sendo assim, em 1987, a instituição foi renomeada para Matra Racing.
Traçando um planejamento ambicioso, que visava a conquista da Copa dos Campeões da UEFA até 1993, a empresa automobilística administrada pelo magnata Jean-Luc Lagardère aportou um montante significativo no clube. Assim, nomes como Luis Fernández, Pierre Littbarski, Maxime Bossis, Thierry Tusseau, desembarcaram na capital francesa para defender os “Pingouins”
Apesar de terminar a primeira temporada como artilheiro do elenco, com 14 gols, Enzo Francescoli quase foi rebaixado com a equipe, que terminou na 13ª colocação. Atenta à situação e em busca de um referente para substituir Michel Platini, que se aposentou em 1987, a Juventus voltou à carga em busca do uruguaio. Entretanto, o ex-jogador do River Plate rechaçou a investida dos italianos e permaneceu.
Para a temporada 1987/1988, juntamente com o técnico português Artur Jorge, o melhor com quem Francescoli trabalhou, de acordo com a opinião do próprio, também chegou ao clube o zagueiro holandês Sonny Silooy. Competitivo, o Matra Racing figurou nos postos mais altos da tabela durante boa parte do campeonato.
Todavia, uma sequência de 12 rodadas sem vitórias na reta final do torneio distanciou os líderes da equipe, que terminou em 7º, 11 pontos atrás do campeão Mônaco e fora das competições europeias. Em contrapartida, com oito tentos, Francescoli foi novamente o artilheiro do plantel. Além disso, foi eleito o melhor jogador estrangeiro atuando na França em 1987.
Insatisfeito com os resultados da equipe, que, na temporada 1988/1989, escapou do rebaixamento à Ligue 2 pelo saldo de gols, muitos deles de autoria de “El Príncipe”, novamente artilheiro do time, Lagardère deixou o clube, que caiu no esquecimento com a ascensão do PSG.
Por sua vez, Francescoli acabou contratado pelo Olympique de Marseille, atual campeão do Campeonato e da Copa da França. Apesar de ter atuado somente uma temporada, Francescoli performou em um nível tão excepcional que encantou um jovem torcedor dos “Les Olympiens”: Zinédine Zidane. A idolatria de “Zizou” era tamanha que, tempos mais tarde, o craque batizaria um de seus filhos com o nome de Enzo.
“Descobri (que havia batizado seu filho de Enzo) um pouco antes da Intercontinental de 1996. Ali Zidane contou que ia ser especial jogar contra o River porque eu estava lá, que ele ia me ver treinar no Marseille quando era garotinho e que havia batizado seu filho recém-nascido de Enzo. Por isso, dei minha camisa para ele após a partida. Depois soube que ele usava como pijama na concentração do Mundial (de 1998) e da Juventus”, disse.
Uma das principais peças do bicampeonato consecutivo do Olympique de Marseille, “El Príncipe” reencontrou o Racing nas semifinais da Copa da França. Em sua passagem por Paris, o uruguaio sequer avançou às oitavas de final, tendo sucumbido para o Créteil e Rennes, respectivamente. Frente a sua ex-equipe, todavia, o OM acabou eliminado.
Na Copa dos Campeões da UEFA, na mesma fase, os franceses foram rechaçados pelo Benfica. Na ida, no Estádio da Luz, venceram por 1-0. Na volta, no Vélodrome, foram derrotados por 1-2. Assim, pelo critério do gol marcado fora de casa, a equipe de Jean-Pierre Papin, Chris Waffle e Jean Tigana ficou pelo caminho.
Depois de enfrentar os anfitriões na Copa do Mundo da Itália de 1990, Enzo Francescoli permaneceu na Velha Bota para, enfim, disputar o Calcio. Desse modo, transferiu-se, conjuntamente com os também “charruas” José Óscar Herrera e Daniel Fonseca, para o Cagliari.
Na capital da Sardenha, “El Príncipe”, durante as temporadas 1990/1991 e 1991/1992, conviveu novamente com as brigas contra o descenso. Contudo, diferentemente de outrora, Enzo não contribuiu ativamente com gols. Atuando como um “trequartista”, incumbido de iniciar as jogadas, Enzo foi as redes quatro e seis vezes, respectivamente.
Na terceira temporada, teve um impacto preponderante para a expressiva 6ª colocação dos “Rossoblù”, a qual credenciou a equipe à Copa da UEFA, com sete gols. No mata-mata, o Cagliari acabou eliminado para o Milan apenas nas quartas de final da Copa da Itália, vencida pelo Torino, para onde Enzo rumou no ano seguinte.
Dividindo vestiário com seus compatriotas Marcelo Saralegui e Carlos Alberto Aguilera, “El Príncipe” quase trouxe o bicampeonato para Turim, mas acabou eliminado pelo surpreende Ancona nas semifinais. Na Serie A, “Il Toro” acabou na 9ª colocação, cinco pontos à frente do Brescia, o primeiro rebaixado, e dois pontos atrás de seu ex-clube, o Cagilari, o último classificado às competições europeias. Enzo marcou apenas três gols.
Habilitados com o título da Copa da Itália de 1993 para a disputa da Recopa Europeia, o Torino caiu nas quartas de final, quando foi eliminado pelo futuro campeão Arsenal. Já na Supercopa da Itália, Francescoli viu sua chance mais clara de vencer um título na Velha Bota escapar para o Milan.
Sem conduzir a Seleção do Uruguai à Copa do Mundo, “El Príncipe”, então com 33 anos, regressou no segundo semestre de 1994 coberto de questionamentos ao River Plate. Entretanto, assim que adentrou as quatro linhas mandou para os ares qualquer ressalva enquanto ao seu futebol.
Com 12 gols, foi artilheiro do Apertura daquele ano, conquistado pelo River Plate de maneira invicta. A consagração veio em um “Superclássico” em La Bombonera, quando Francescoli balançou as redes duas vezes.
Sem o menos brilho da temporada anterior, em 1995, o River terminou em 10º no Clausura e em 7º no Apertura. Na Copa Libertadores, “Los Millionarios” chegaram até às semifinais, mas foram eliminados, nos pênaltis, em pleno Monumental de Núñez, pelo Atlético Nacional. Na mesma altura e da mesma maneira, o River foi despachado pelo Independiente da Supercopa da Libertadores, na qual Francescoli foi artilheiro.
Em contrapartida, brilhou na Seleção do Uruguai. Batendo o Brasil, então campeão mundial, na final, “La Celeste Olímpica” sagrou-se campeã da Copa América, a terceira da carreira de Enzo, que após a conquistou resolveu se “aposentar” da Seleção para dedicar-se exclusivamente ao River Plate. Individualmente, eleito o melhor jogador sul-americano e o melhor jogador do futebol argentino.
Com seu nome marcado na história de “Los Millionarios”, Francescoli se colocou no panteão mais alto do clube em 1996. Liderando um plantel recheado de jovens pratas da casa, como Juan Pablo Sorín, Matías Almeyda, Ariel Ortega, Marcelo Gallardo e Hernán Crespo, Enzo conduziu o River novamente à final da Copa Libertadores em 1996, onde encarou o mesmo rival de dez anos atrás, o América de Cali, de nomes como Óscar Córdoba e Jorge Bermúdez.
Apesar da derrota por 1-0 na Colômbia, Francescoli pediu Monumental de Núñez pediu a palavra no vestiário. Até por conta disso, criou-se a lenda de que foi ele quem fez a palestra tática para a finalíssima, e não Hernán Díaz.
“Sentia que era minha última oportunidade de ganhar a Libertadores e lhes disse: ‘Ninguém imagina quanto valem estes 90 minutos’. Com 34 anos havia aprendido a dar valor a coisas, que com 24 não dava. Queria deixá-los com o sangue fervendo, mas não falei de tática.
A vitória por 2-0, com dois gols de Crespo, no Monumental de Núñez abarrotado deu a América pela segunda vez ao River Plate. O título suavizou uma antiga decepção de Enzo. Isso porque, dez anos antes, o uruguaio havia se transferido ao futebol francês e naquele segundo semestre “Los Millionarios”, frente ao mesmo adversário, sagraram-se campeão da Copa Libertadores pela primeira vez e, posteriormente, venceriam também a Intercontinental.
Empatados em números de Libertadores e com a chance de ultrapassar o Boca Juniors nos títulos Intercontinentais, o River de Francescoli, apesar do 1-0, foi presa fácil para a Juventus de Zidane.
“Quando vi Francescoli jogar, ele era o jogador que eu queria ser. Ele era o jogador que eu via e admirava no Olympique de Marseille, meu ídolo. Joguei contra ele quando estava na Juventus. Quando você joga contra o cara que você adorou a vida todo, é quando percebe que se tornou grande. Enzo é como um deus”, declarou Zizou.
Antes de Tóqu, Enzo, foi convencido pelo então presidente uruguaio, Julio María Sanguinetti, a voltar a defender a camisa de “La Celeste Olímpica”, que corria sérios riscos de não participar da Copa do Mundo de 1998. Mesmo assim, o Uruguai não foi à França, chegando à última rodada sem chances matemáticas de classificação, terminando na 7ª colocação.
Em 20 de agosto de 1997, na vitória, em Montevidéu, por 1-0 sobre o Chile, Enzo fez sua última partida pela Seleção, onde realizou 73 partidas, com 37 vitórias, 18 empates e 18 derrotas, tendo balançado as redes em 17 oportunidades.
Campeão do Apertura de 1996, nove pontos de vantagem para o vice-campeão, o Independiente, o River Plate emendou um tricampeonato nacional com as conquistas do Clausura e do Apertura do ano seguinte. De quebra, a equipe sagrou-se campeã também da Supercopa da Libertadores de 1997.
Dessa maneira, no início de 1998, Francescoli recusou uma proposta de 1 milhão de dólares para prosseguir, anunciando que iria pendurar as chuteiras.
Imortalizado na história do clube “El Príncipe” não nutria um bom relacionamento com o técnico Ramón Díaz, que ficou marcado pelas dispensas de alguns ídolos “Riverplatenses”.
“Se Ramón tem ou não bronca de mim, precisaria que alguém perguntasse a ele. Assim que chegou ao River, saíram Cedrés, Burgos, Hernán Díaz, Astrada, Berti, todos líderes. O único que ele não pôde foi comigo, porque eu era muito forte”, contou.
As duas últimas partidas de Francescoli com “La Banda Roja” encerraram com chave de ouro uma trajetória de cinema. Em um intervalo de quatro dias, o River Plate faturou dois títulos.
Em 17 de dezembro de 1997, após empatar, no Morumbi, o River bateu por 2-1 o São Paulo e sagrou-se campeão, de maneira inédita, da Supercopa da Libertadores. Já no dia 21, ao empatar fora de casa em 1-1 com o Vélez Sarsfield, conquistou o Apertura de 1997, desbancado o Boca de Juniors de Diego Maradona.
Em 1º de agosto de 1999, Enzo regressou ao gramado do Monumental de Núñez, para sua partida de despedida, um amistoso contra o Peñarol. Os mais de 60 mil presentes, nos quais incluíam até alguns “hinchas” do Boca, assistiram “El Príncipe” balançar as redes duas vezes e o River vencer por 3-0.
Conforme o dia do jogo se aproximava, o compositor argentino, Ignacio Copani, em homenagem a Francescoli, lançou a música “Inmenzo”, cantada na despedida, a qual termina com o pedido:
“Quero te ver mais uma vez, querido Inmenzo, Quero te ver mais uma vez, te suplico”.
Ao todo, Enzo Francescoli defendeu a camisa do River Plate em 286 partidas, tendo marcado 137 gols, 7º maior artilheiro da história do clube, e 3º estrangeiro que mais balançou as redes na Argentina, atrás apenas de Arsenio Erico e Delfín Benítez Cáceres.
Pouco antes de ser aposentar, o ídolo dizia que assumiria algum dia o comando técnico de “Los Millionarios”. Apesar da vontade nunca ter sido concretizada, oportunidades para tal não faltaram.
“(Me convidaram para ser técnico do River) cinco ou seis vezes, cada vez que houve problemas. A primeira foi quando jogava. Disse à Davicce: ‘Mas estou jogando tão mal?’ Foi antes de uma partida contra o Boca, em Mar del Plata; haviam dado um ultimato a Ramón Díaz, eu tinha acabado de operar o ombro e ganhamos por 1-0 com gol meu. Então, para dar apoio, chamei ele para subir no pódio. A última vez foi depois de Passarella”, contou.
Casado com Mariela Yern desde 1984, e pai de dois filhos, Bruno e Marco, Francescoli retornou, após 23 anos, ao River Plate no final de 2013. Contratado pelo presidente do Rodolfo D’Onofrio, o ídolo assumiu a Secretária Técnica, sendo responsável direto pela implementação de uma metodologia voltada para as canteras, bem como pela chegada de Gallardo e, consequentemente, do período vitorioso recente do clube.