Trivela
·09 de maio de 2023
Trivela
·09 de maio de 2023
A Eredivisie selou um rebaixamento surpreendente neste final de semana. O Groningen, depois de 23 participações consecutivas na primeira divisão dos Países Baixos, sofreu um descenso inapelável. Os alviverdes vinham perdendo fôlego nas temporadas recentes, mas nada comparado com o que aconteceu em 2022/23. A equipe passou o segundo turno inteiro na zona de rebaixamento e não deu sinais de recuperação nesta reta final, em meio a tumultos extracampo. O descenso se sugere mais como uma crise pontual do que estrutural. De qualquer maneira, ficam para trás os tempos relevantes de um time que pintou até na fase de grupos da Liga Europa durante a última década.
O Groningen é um clube que, desde a fusão que originou seu surgimento em 1971, se manteve como um tradicional participante da primeira divisão. Teve suas quedas para a segundona, mas nada que durasse muito tempo longe da elite. Um período de maior relevância ocorreu na virada dos anos 1980 para os 1990, quando surgiram os irmãos Ronald e Erwin Koeman em suas fileiras. Foram sete participações nos torneios continentais de 1983 a 1993. A equipe pintou seis vezes na Copa da Uefa, chegando a eliminar o Atlético de Madrid em duas oportunidades, e também jogou uma vez a Recopa. No âmbito nacional, o ápice ficou com o vice da Copa dos Países Baixos em 1988/89 e a terceira colocação na Eredivisie em 1990/91.
Foram 18 temporadas consecutivas na elite, até que a queda ocorresse em 1997/98. Duas temporadas depois, o Groningen conseguiu o acesso e iniciaria uma estadia ainda mais longa na elite, num período em que também apresentou muitos talentos – do calibre de Arjen Robben, Luis Suárez e Virgil van Dijk. De início, os alviverdes ainda brigavam contra o descenso. Já de 2005/06 a 2020/21, veio o período de maior relevância na tabela. Em todas essas temporadas, somente duas vezes o Groningen ficou abaixo do nono lugar. Na maior parte das vezes, a equipe variava entre a sétima e a oitava colocação. Teve um sucesso maior com o quinto posto em 2010/11, além do auge com a conquista da Copa dos Países Baixos em 2014/15. Não era exatamente uma potência, mas o clube merecia respeito como uma força intermediária de destaque ocasional.
A temporada passada já não teve o melhor rendimento do Groningen. O time ficou no 12° lugar da Eredivisie, igualando sua pior colocação nos últimos dez anos. Ainda assim, não soava um sinal de alerta maior. Até que o processo de renovação para a atual temporada deixasse rombos. Os alviverdes perderam jogadores importantes (o atacante Jörgen Strand Larsen, o lateral Bjorn Meijer, o meia Mohammed El Hankouri e o centroavante Michael de Leeuw), assim como o técnico Danny Buijs foi dispensado após quatro anos de trabalho. Frank Wormuth, que vinha do rebaixado Heracles, não gerou o impacto esperado no comando técnico. Apesar disso, o desempenho na metade inicial do primeiro turno ainda manteve os nortistas no meio da tabela, com três vitórias e três empates nas primeiras 12 rodadas. Isso até que a coisa degringolasse a partir do fim de 2022.
O Groningen teve uma sequência de sete derrotas entre novembro e janeiro. O time não parou bem para a Copa do Mundo e voltou pior das férias, mesmo com a troca no comando técnico e a promoção do antigo assistente, o inexperiente Dennis van der Ree. Algumas derrotas foram muito custosas, sobretudo pela quantidade de confrontos diretos – em especial contra Cambuur e Volendam. Os alviverdes não só entraram na zona de rebaixamento, como também seguraram a lanterna. O símbolo dessa derrocada aconteceu em 27 de janeiro, com uma invasão de campo dos torcedores revoltados com a situação. Naquelas semanas, os nortistas ainda tinham sido eliminados pelo Spakenburg, da terceira divisão, na Copa dos Países Baixos. Como se não bastasse, Neraysho Kasanwirjo, uma das revelações da zaga, saiu para ser reserva no Feyenoord.
Uma breve reação aconteceu em fevereiro, com empates diante de Twente e Emmen, além de uma vitória sobre o Excelsior. O Groningen deixou a lanterna com o Cambuur e ficou a um ponto de alcançar a zona dos playoffs contra o descenso. Existiam sinais positivos de um time que parecia bem treinado, mas não exibia confiança suficiente. Desde então, a equipe derreteu e engoliu mais sete derrotas consecutivas – com novos episódios de violência, de jogador agredido por torcedor (Jetro Willems tomou um tapa) a bandeirinha atingido por copo de cerveja atirado das arquibancadas. Não foi o empate contra o Go Ahead Eagles no domingo que evitou a confirmação do descenso, com três rodadas de antecedência. São dez pontos de distância para alcançar Emmen e Excelsior logo à frente. Pela primeira vez neste século, os alviverdes estavam rebaixados.
O curioso é que o Groningen possui bons talentos à disposição. O principal deles é o centroavante Ricardo Pepi, emprestado pelo Augsburg. O atacante da seleção americana é de longe a principal fonte de gols dos alviverdes, com 12 tentos, o quádruplo de qualquer outro companheiro. O ponta finlandês Oliver Antman e o meia eslovaco Tomas Suslov são outros vistos com certa expectativa. Mas, apesar do potencial desses garotos, faltou um pouco de mais casca no elenco para lidar com o drama. Vale lembrar que Arjen Robben estava no grupo até 2021, apesar das poucas aparições por conta das lesões.
Já uma figura que recebeu muitas críticas por suas decisões foi o diretor esportivo Mark-Jan Fledderus. No clube desde 2019, seria ele um dos responsáveis pelo retorno de Robben. Por outro lado, tomou uma série de decisões contestáveis no planejamento do projeto esportivo. A troca de Danny Buijs por Frank Wormuth no comando técnico é considerada um tiro no pé. A demissão do antigo ídolo Paul Matthijs de seu cargo nas categorias de base também gerou muito ruído. Não à toa, o próprio Fledderus perdeu seu emprego em fevereiro.
Uma boa notícia para o Groningen é a volta de Henk Veldmate. O dirigente foi um dos principais responsáveis pelo sucesso dos alviverdes, ao ocupar o cargo de diretor esportivo de 1998 a 2014. Nos últimos sete anos, ele permaneceu como chefe de recrutamento do Ajax, mas retornará para casa na próxima temporada. Já Dick Lukkien, treinador do Emmen desde 2016 e antigo assistente do próprio Groningen, está acertado para ser o novo técnico a partir de julho. Terá a missão de liderar o acesso.
Pela tradição e pela capacidade competitiva, não é de se duvidar que o Groningen consiga o acesso de imediato. Os alviverdes precisarão mudar peças no elenco, até porque algumas promessas dificilmente continuarão na segunda divisão. De qualquer maneira, o clube possui estabilidade suficiente para se reerguer. Mas não deixa de ser uma quebra de perspectiva ver o time militando na segundona, quando estava acostumado a brigar por vaga nas copas europeias. Não será a readaptação das mais simples e deixa dúvidas quando o relativo sucesso de outrora voltará.