Trivela
·25 de outubro de 2022
Trivela
·25 de outubro de 2022
O San Lorenzo conquistou o maior título de sua história em 2014. A Copa Libertadores encerrou uma aguardada espera da torcida azulgrana, bem como décadas de gozações dos rivais pela taça ausente no museu do Ciclón. Seria uma campanha improvável, em que o time de Edgardo Bauza flertou com a queda na fase de grupos e se transformou nos mata-matas. Vários favoritos ficaram pelo caminho, numa das edições mais surpreendentes do torneio. Mas, no fim das contas, a tradição dos cuervos pesou na reta para cumprir um verdadeiro sonho. Entre os heróis daquela caminhada, Sebastián Torrico acumulou milagres com suas luvas abençoadas pelo Papa, enquanto Néstor Ortigoza era o motor do meio-campo que não perdia pênaltis – e foi assim que marcou na decisão. Dois ídolos tremendos no Gasómetro, que encerraram juntos a carreira profissional no sábado. Como era de se esperar, a homenagem oferecida pela torcida foi de arrepiar.
Aos 42 anos, Torrico precisa figurar em qualquer lista dos maiores goleiros da história do San Lorenzo. Jogou antes por Godoy Cruz e Argentinos Juniors, mas foi no Ciclón que ele se transformou em lenda a partir de sua chegada em 2013. Não demorou a fazer diferença, com a conquista do Torneio Inicial do Campeonato Argentino no mesmo ano. Pois viria mais. O arqueiro teve um desempenho impressionante na Libertadores de 2014, em especial nos duelos contra os brasileiros nos mata-matas. Torrico pegou dois pênaltis nas oitavas contra o Grêmio e acumulou milagres nas quartas diante do Cruzeiro. Foram momentos que embalaram aos cuervos rumo ao título.
Depois disso, Torrico nunca mais saiu do clube. Que novos títulos não tenham se repetido e ele passasse a frequentar a reserva nos últimos anos, já tinha se eternizado como o “anjo da guarda” na meta do time de Papa Francisco. As defesas que pareciam impossíveis eram uma especialidade do veterano e se repetiram tantas vezes no Campeonato Argentino. Além disso, a proximidade com os torcedores e com os demais companheiros garantia uma influência enorme nos corredores do San Lorenzo. É daqueles personagens que tendem a voltar com algum cargo diretivo, pela relação que prevalece.
Néstor Ortigoza, por sua vez, teve uma história mais ampla além do San Lorenzo. O meio-campista já era campeão com o Argentinos Juniors e participou de competições internacionais pela seleção do Paraguai, quando o Ciclón o levou em 2011. Ainda levou um tempo para se encaixar, mas virou o maestro que ditava o ritmo dos azulgranas e conduzia o time com muita competência, mesmo que não tivesse muita pinta de jogador – pelo contrário, com seu semblante rechonchudo e a postura arqueada. Na verdade, era um jogadoraço, daqueles que sobram em técnica e em empenho, o que se provou na Libertadores de 2014. Ortigoza jogou o fino naquela campanha, ao lado de Juan Mercier na cabeça de área. E para quem estava acostumado a receber uns trocados em disputas por pênaltis na periferia onde cresceu, assumir a bronca na marca da cal não era problema. Seria do volante a incumbência de cobrar o pênalti que confirmou a vitória por 1 a 0 na final contra o Nacional-PAR.
Ortigoza ficou nos cuervos até 2017, quando não entrou em acordo para a renovação de seu contrato e já recebeu uma calorosa despedida da torcida. Passaria depois por Olimpia, Rosario Central e até pela segundona argentina, no Estudiantes de Río Cuarto. Porém, sua despedida precisava acontecer mesmo no Nuevo Gasómetro, e por isso ele voltou em 2021. Aos 38 anos, “El Gordo” sofre ainda mais com seu físico, que já não era dos mais exemplares. A eficiência e o senso de responsabilidade, ainda assim, são muito mais importantes para traduzir a grandeza do meio-campista em Bajo Flores. Ajudou demais no crescimento do Ciclón em sua caminhada até o topo da América.
Torrico e Ortigoza não jogaram tantas partidas assim na atual edição do Campeonato Argentino. O goleiro acumulou nove aparições, sempre com a braçadeira de capitão. O meio-campista entrou em campo 11 vezes, na maioria das vezes saindo do banco. Foi assim inclusive na vitória recente contra o Vélez, em que entrou só para bater um pênalti nos acréscimos do segundo tempo – e converteu, claro. Já neste sábado, ambos seriam nomes obrigatórios no duelo contra o Aldosivi, que fechou a campanha do Ciclón no Nuevo Gasómetro. Os azulgranas venceram por 3 a 0, em resultado que valeu para a classificação à Copa Sul-Americana de 2023. E o melhor ficaria para depois, com o tributo oferecido pelo clube.
A taça da Libertadores esteve em campo, assim como antigos companheiros naquela campanha vitoriosa de 2014. Torrico e Ortigoza ergueram o troféu, antes de uma volta olímpica no Nuevo Gasómetro. A atmosfera no estádio era incrível, com muitos foguetes e fumaça colorida para celebrar as lendas. E precisava acontecer uma disputa particular nos pênaltis, tão decisivos nas trajetórias de ambos. Como bons amigos, Ortigoza facilitou a defesa de Torrico no primeiro e o goleiro retribuiu a cortesia para o volante anotar o segundo. Uma imagem eterna da dupla de lendas.
Os nomes de Torrico e Ortigoza não serão os primeiros citados quando se listar os grandes do futebol argentino. Entretanto, a idolatria não corresponde só a isso. Ela diz muito sobre espírito vencedor e liderança dentro de campo. Torrico e Ortigoza conduziram o San Lorenzo às suas melhores noites. O goleiro, tornando seu gol intransponível. O volante, assumindo responsabilidades decisivas. Juntos, são inescapáveis na narrativa daquela equipe campeã em 2014, dois grandes protagonistas ao lado de Leandro Romagnoli e Ignacio Piatti. Os azulgranas nunca se esquecerão.
Lo último que ve la historia de #SanLorenzo antes de escribir el capítulo más lindo de su historia.–